Níobe (Niobe), Alfred Noyes
Igual aos céus, curvada sobre a filha,
Qual o horizonte, unida à própria dor!
Oceano algum, que aflições descarrilha,
Nuvem ou chuva de fraco fragor
Apaga o alticerúleo sofrimento,
A angústia regelada, régia e muda.
Curvada sobre a terra parturiente,
Sabe: a esperança é momento—
Breve se vinda, vindoura, ou presente;
Em dó quer abrandar-lhe a falta aguda.
Fala o universo através de tal face,
Qual fala a branca flor pelo espinheiro;
E Prometeu qualquer que amaldiçoasse,
Mas sem morrer, um panteão inteiro
Tem voz em tal beleza. Uma tal fronte
Sobre as covas da inteira terra desce;
Seu o lamento que em Ramá se ouviu,
Coberta de sangue infantil;
Seu o silêncio que ao dos Céus afronte,
Seu o rosto em que o mundo se une em prece.
A dó, a dó que tem do humano amor
Corre-lhe à face, à desgraça voltada;
Seu peito tem da paloma o palor,
Que jamais, pois ao ninho congelada,
Feliz respirará por sobre as crias,
Que ampara até a morte. E é só a morte,
Do horrendo transe, a morte a só saída.
A face em agonias
E a carne em pedra feitas, eis-lhe a sorte;
Sabe ora quanto ensinam Tempo e Vida.
Seu vasto, doce e delicado amor,
Seu corpo, as setas portando de Apolo,
Expostos ao trovão, inda o pavor
Da filhinha aconchegam junto ao colo.
Mudo e imortal, ela inteira é um grito,
Espasmo de uma dor tão vencedora
Que faz curvar-se o céu quando ao céu voa!
Pertencem-lhe ao pesar aflito
Quinhão e realeza imorredoura,
Somente o luto porta essa coroa.
Notas
- Níobe (título): A rainha Níobe se gabara de que sua prole de filhos e filhas era muito mais numerosa que a da deusa Leto; Apolo e Ártemis, filhos da deusa, puniram-lhe o orgulho matando-lhe todos os filhos e filhas; a última, a mais nova, foi flechada nos braços da mãe. Com a dor, a rainha se converteu em pedra.
- Ramá (v. 17): Atual Er-Ram; em Jeremias (31,15), a cidade é descrita como local de um massacre, e Raquel, esposa de Jacó e mãe de Benjamin (tribo à qual pertence a cidade em questão), chora seus filhos mortos: Em Ramá se ouve uma voz, / lamentação, choro amargo; / Raquel chora seus filhos, / ela não quer ser consolada por seus filhos, / porque já não existem. A profecia é retomada por Mateus no episódio do massacre dos inocentes (2, 16-18).