Dois poemas de Charles Simic
(1)
Meu amigo Alguém
Por uma rajada de ar fresco,
Talvez, uma porta se abriu
Alhures no quieto entardecer.
À soleira alguém hesita
Com um vago sorriso
Duma feliz premonição.
Nesse dia sem data,
Numa ruela às escuras,
Senão pela luz dum televisor
Aqui e acolá,
E por uma árvore sozinha em flor
Longa uma trilha traçando
De brancas pétalas e sombras.
(2)
Todos esses espelhos
E aquele que pega no teu pé,
Meu caro, e que te fica atormentando
Cum resfolegar de velho
Mal o olhas, toda vez, ou quando
Deixas, alto e claro, escapar algo
Em tua defesa, teu queixo erguendo enquanto
Ele cospe e se engasga em resposta.
Tens a navalha ao pescoço.
As linhas já se vincam
Em tua testa ao ouvires atento
Coa maçaroca de papel-toalha
Já se encarnando sob o olho esquerdo.
Em homenagem ao poeta sérbio-estadunidense, por ocasião de seu passamento aos 84 anos, a 9 de janeiro de 2023.