Dois senhores solteiros (The Two Old Bachelors), Edward Lear
Dois senhores solteiros viviam num barraco;
Um deles pegou um bolinho, o outro pegou um rato.
Disse o que pegou bolinho ao que pegou o rato:
“Bem na hora! Pois nada temos no barraco,
Exceto um pingo de mel e uma fatia de limão,
Que faremos pro jantar? Dinheiro, não temos, não!
E da vida sem jantar o que esperar?
—Cair-nos um a um os dentes, e mais ainda definhar.”
Disse o que pegou rato ao que pegou o bolinho:
“Poderíamos cozinhar o rato, se tivesse um temperinho.
Se tivéssemos sálvia ou cebola, ficaria delicioso.
Mas como consegui-los, se tudo é tão custoso…”
Correram então à cidade os dois solteiros,
Pedindo por sálvia ou cebola o caminho inteiro;
Cebolas, emprestaram duas, mas sálvia, nenhuma,
Na feira, no mercado, nem em parte alguma.
Mas eis ouviram: “Num monte meio meridional,
Onde um caminho estreito leva ao topo ortogonal,
Um sálvio habita, mui venerando,
Entre ariscas pedras, intratável tratado estudando;
Para agarrá-lo, aproximai-vos de mansinho,
Trazei-o ao sopé, picai-o em pedacinhos;
Juntai-o à cebola (que igual deveis picar),
E o tempero tereis para o vosso jantar.”
Os senhores solteiros, após isso ouvir,
Puseram-se prestes ao monte escarpado subir;
No topo, entre as pedras, sentado num canto,
O sálvio avistaram, tratado estudando.
“Venerando sálvio”—disseram—, “sei que lês com esmero,
Mas a hora chegou de virares tempero.”
Erguendo a cabeça, o sálvio mui calmo os fitou,
Pesando o livro em mãos, nas carecas mirou;
Morro abaixo e precipício, a livrada os fez rolar,
E rolaram sem nunca em cidade ou lavoura parar.
Enfim descobrem, ao barraco voltando sem tempero,
Que o rato fugira, não sem antes comer o bolinho inteiro.
Calados cruzaram a porta da casa, outrora amicíssima,
E, dos senhores solteiros, nunca mais houve notícia.