Dois Lázaros, Chinua Achebe & Sylvia Plath

Dois Lázaros, Chinua Achebe & Sylvia Plath
Photo by Kelly Sikkema / Unsplash

Lázaro (Lazarus)

Chinua Achebe

Conhecemos a alegria esfolegante
das irmãs quando a palavra se espalhou:
ressuscitou! Mas um homem que viveu
uma vida inteira terá outros com
quem se haver além das irmãs. Certamente,
ao ávido assistente que ascendeu
à sua mesa no escritório, tal ressurreição
será embaraçosa… O malfadado povo
de Ogbaku sabe o terror que sentiu quando
o mal bicéfalo pisou em sua estrada.
Não teria sido fácil retomar
as clavas pintalgadas de sangue que outrora
abandonaram; ou dar as costas ao corpo
espancado do advogado, caído ao lado
da limusine espancada pra dar cabo
de um dos seus, mexendo-se de supetão
em ressurreição esbugalhada… Quão bem
compreendiam, os aldeões de cara amarrada,
outra vez brandindo as armas encarnadas,
quão bem compreendiam que ao se reerguer
o membro de seu clã vingado em assassínio
lhes daria as costas, confraternizando
outras lealdades, e os acusaria,
e dum sopro apagaria seus clamores
e justificativas! Então, mataram-no
uma segunda vez no despontar
duma promissora ressurreição.

Fonte: Collected Poems (Anchor, 2004).

Estrada a Benim (Benin Road), Chinua Achebe
Tradução de um poema do escritor nigeriano Chinua Achebe (n. 1930-2013).

Madame Lázaro (Lady Lazarus)

Sylvia Plath

Fiz de novo.
Uma vez em cada dez anos
Dou um jeito…

Quase um milagre ambulante, a pele
brilhante abajur nazista,
o pé direito, um peso

De papel, o rosto
Um linho judeu,
Fino e sem formas.

Tira as gazes,
Ó meu inimigo.
Causo-te horror?…

O nariz, as órbitas, a arcada dentária?
O bafo azedo
Logo some.

Logo, logo me sinto
em casa na carne
que a cova comeu.

Eu, mulher risonha.
De apenas trinta.
E, feito um gato, tenho nove mortes.

Esta foi a de número três.
Que porqueira
Aniquilar-se a cada década.

Que milhão de filamentos.
A multidão se apinha pra me ver
Comendo amendoim.

Desenrolam-me inteira—
O grande strip-tease.
Senhoras e senhores,

Eis-me as mãos,
Os joelhos,
Posso ser pele e osso,

Entretanto, sou a mesma mulher de antes.
Na primeira vez, eu tinha dez.
Foi acidente.

A segunda era pra ser
permanente, sem volta.
Fechei-me

Feito concha.
Tiveram que chamar e chamar
E tirar os vermes feito pérolas peguentas.

Morrer
É uma arte, como tudo o mais.
Domino-a deveras.

Morro pra seja um inferno.
Morro pra que seja a morte.
Pode-se dizer que é minha vocação.

É fácil demais numa cela.
É fácil demais morrer e ficar morta.
É a teatralidade

Da volta em plena luz do dia
Ao mesmo lugar, ao mesmo rosto, ao mesmo grito
Bruto e espantado:

É um milagre!
Isso me derruba.
Avança o pelotão

Vem ver-me as chagas, avança o pelotão
Querendo uma palavra ou toque
Ou gota de sangue

Ou mecha ou pedaço de roupa;
Pois então, Herr Doktor
Pois então, Herr Feind.

Sou obra tua,
Tua preciosidade,
Neném d’ouro puro

Que um grito derrete.
Giro e ardo.
Não penses que faço pouco de teu muito zelo.

Cinzas, cinzas…
Cutucas e revolves.
Carne, osso, não ha nada…

Uma barra de sabão,
Um anel de noivado,
Uma obturação de ouro.

Herr Gott, Herr Luzifer
Cuidado
Cuidado.

Das cinzas,
Levanto a ruiva coma, a rubra face,
E homens devoro como os respirasse.

Lady Lazarus by Sylvia Plath | Poetry Foundation
I have done it again.