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O que significa “em tradução livre”?

O que significa “em tradução livre”?

Ao ler uma reportagem nacional que envolva personalidades ou assuntos internacionais, após a tradução da fala de algum ator, político ou pesquisador, você já deve haver visto a expressão “em tradução livre”. É comum que as traduções empregadas na mídia digital venham tachadas como “livres”? Você já se perguntou o porquê dessa prática?

Não posso afirmar com certeza, mas, como tradutor—como alguém que consegue perceber as inadequações das traduções veiculadas pela mídia digital, e consegue inferir a estrutura do texto original a partir delas—, minha hipótese é a de que este adjetivo tem por objetivo aliviar os redatores da responsabilidade por eventuais deslizes.

Trata-se, pelo que vejo, de traduções amadoras, feitas por pessoas de outras áreas, com algum domínio do inglês—suficiente para que leiam textos em língua estrangeira, mas talvez insuficiente para que sejam tradutoras profissionais—; mesmo quando acertam na tradução, podem permanecer inseguras quanto à sua correção.

Como muitas vezes ocorre na publicidade e na comunicação oficial de instituições, empregam-se alguns termos, de modo a mascarar certas relações. Aqui não é diferente: se a tradução é considerada “livre”—se é descrita, junto a um público leigo em matéria de tradução, como “livre”—, então estaria perdoada por se desviar sintaticamente (e talvez semanticamente) de seu texto-fonte.

Como tradutor, porém, posso afirmar que se trata apenas de um subterfúgio técnico. Uma ressalva tática, que não altera nem as obrigações de um tradutor para com o seu texto-fonte nem o grau de correção do texto-meta.

Para começo de conversa não é tão simples determinar o que seria uma tradução “livre”; desvios sintáticos e lexicais são a norma em se tratando de tradução, pois não existem duas línguas que tenham exatamente a mesma estrutura, ou que organizem seu material linguístico exatamente do mesmo modo. Determinar a partir de que ponto uma discrepância sintática (ou mesmo semântica) é uma “licença tradutória” tem algo de arbitrário: não há critérios universalmente aceitos, entre tradutores ou estudiosos da tradução, para se quantificar desvios.

De toda forma, para o tipo de tradução breve necessária em matérias jornalísticas, seria suficiente, para o leitor leigo, lembrar-se da seguinte instrução:

Se a tradução está correta, não é livre, mesmo que se desvie da estrutura formal do texto-fonte. Se a tradução está incorreta, não é livre: é incorreta.

Profissionais existem para serem contratados. Profissionais especializados existem para oferecerem serviços que não podem ser realizados sem formação ou experiência específica. Usar um adjetivo para escamotear a necessidade de se contratar profissionais é um subterfúgio que, como tradutor, gostaria de ver evitado.