Meu artigo será publicado em inglês: devo enviar o original a um revisor?
Em algumas áreas do conhecimento, é bastante comum que artigos científicos sejam publicados diretamente em (tradução para o) inglês. Se o autor não for suficientemente proficiente para redigir o artigo em língua estrangeira, redige-o em português, e o envia a um tradutor (que, num lapso laboral e metodológico recorrente, nem sempre recebe crédito pelo trabalho). Não obstante, mesmo a autores com nível universitário pode faltar suficiente domínio da escrita em língua materna, e podem cometer deslizes, desviando-se da norma-padrão em graus variados.
A tarefa do revisor e a do tradutor têm em comum a necessidade de entregar uma interpretação do texto. Muitas vezes, essa interpretação deve ser mais clara, menos ambígua do que o texto original—algo que parece subjazer à ética dos tradutores profissionais, embora seja mal visto por algumas teorias de tradução de pendor mais propriamente prescritivo, ligadas à literatura.
Para revisores e tradutores, pequenos lapsos em relação à norma padrão podem não causar problemas: uma vírgula faltando, um acento gráfico omitido, etc. podem parecer inofensivos, e é mesmo a tarefa e razão de ser da revisão detectá-los; outros tipos de problemas, porém, podem tornar o texto mais ambíguo ou confuso, e forçar a mão dos profissionais na escolha de uma interpretação. Quanto mais sério o erro, quanto mais crucial a sessão do artigo onde ocorre, tanto maiores as chances de uma escrita truncada, nebulosa, e os riscos de uma interpretação equivocada, mesmo por parte de um profissional competente.
Outro problema comum, não necessariamente ligado a erros, mas a determinados estilos de escrita de determinadas áreas acadêmicas, é a redundância. Embora seja natural que artigos científicos repitam constantemente algumas palavras centrais do texto (que podem ou não haver sido incluídas entre as palavras-chave), por vezes, é possível perceber que algumas reiterações são desnecessárias, e sobrecarregam sentenças com sintagmas nominais longos, apostos e sinônimos que, a bem da verdade, nada agregam à complexidade do pensamento, antes sobrecarregam o processamento da leitura.
Revisores são pagos para alterar a redação; podem oferecer sugestões de alteração e simplificação e mesmo supressão de tais trechos. Para o tradutor, entretanto, põe-se um dilema: a legibilidade (ou seja: a comunicabilidade do texto) entra em conflito com a estrita expressão de seu pensamento. Por um lado, o estilo sobrecarregado pode soar canhestro numa língua cujas práticas redacionais sejam outras; por outro, o tradutor nem sempre se sente confortável efetuando cortes de redundâncias ou movendo informações de lugar.
Assim sendo, mesmo que seu texto em português não venha a ser publicado, é importante que passe por uma revisão textual cuidadosa antes de ser traduzido. Talvez o próprio tradutor atue como revisor, e possa realiza-la antes da tradução, incluindo-a no orçamento. Esta opção teria a vantagem de oferecer uma revisão textual direcionada ao propósito final de traduzir o texto.
Alguns autores podem concluir que isso encarece os custos da publicação. É muito importante, em primeiro lugar, que tenhamos ciência daquilo de que temos real necessidade, dando a nossos diferentes colaboradores e instrumentos o devido valor, para que possamos cumprir nossas obrigações profissionais da maneira mais responsável possível. Um revisor e um tradutor, em alguns casos, podem ser tão necessários quanto o orientador, os colegas de pesquisa, os livros, a biblioteca, o laboratório, a impressora, etc. Valorizar os profissionais que trabalham conosco também é uma forma de valorizar nosso próprio trabalho.
Em segundo lugar, se é verdade que este processo em duas etapas pode soar oneroso, é igualmente verdade que o autor prolixo literalmente paga por sua prolixidade: quanto maior um texto, mais altos os custos de revisão e tradução, e maiores os prazos. A revisão prévia à tradução pode, na verdade, poupar custos futuros, ensinando ao redator onde vem errando ou se excedendo, e auxiliando-o a produzir textos mais dinâmicos e eficientes, conseqüentemente mais baratos e ágeis de se revisar e traduzir.
Converse com seu tradutor sobre a necessidade de uma revisão textual dos originais prévia à tradução; deste modo, garante-se uma tradução mais escorreita, mais livre de problemas interpretativos, e temos ainda a oportunidade de repensar nossa própria escrita uma vez mais, antes que seja vertida para uma outra língua.