Redigindo conclusões de pesquisa
O artigo científico é um gênero ao mesmo tempo bastante flexível e bastante rígido. É flexível, pois é inevitável que diferentes áreas, mantendo pouco contato entre si, assumam práticas redacionais distintas—seja por diferentes necessidades teórico-metodológicas, ou simplesmente por diferentes quadros de valores—; é rígido, pois tem como função atuar como relatório público que oferece os objetivos, procedimentos, e resultados de uma pesquisa ou parte dela.
Talvez mais difícil que redigir os resultados de pesquisa seja redigir a conclusão do artigo. É uma seção na qual muitos autores, nem sempre inexperientes, perdem-se, talvez pela sensação de que não têm mais nada a acrescentar. Conclusões meramente repetitivas, portanto de leitura desinteressante e arrastada, não são incomuns.
Entretanto, o encerramento não é perfunctório, mas uma parte necessária do artigo científico. Para que nossa conclusão nos pareça bem redigida e mantenha o interesse do leitor, é necessário nos atermos ao seguinte:
- A conclusão pode oferecer um breve apanhado do que foi discutido, mas é importante que seja, de fato, breve. Se a conclusão inteira é pura repetição, então está deixando de cumprir suas outras funções.
- A primeira dessas funções é apresentar ou resumir o que foi aprendido com a pesquisa; a conclusão deixa claro para o leitor qual o incremento de conhecimento com o que o artigo contribui para a área. Como se vê, aqui, um certo grau de repetitividade não é mal-vindo, embora, reforçando, a brevidade seja preferencial.
- A repetição excessiva também esconde outro problema bastante comum: repetir os pressupostos teóricos da introdução como conclusões derivadas da pesquisa, gerando um pensamento circular. É necessário cuidado para separar nosso aprendizado inicial (oriundo de nossas leituras teóricas para o artigo ou prévias a ele) do aprendizado específico trazido pela pesquisa.
- A segunda função da conclusão, relacionada à primeira, é comparar ou contrastar o incremento de conhecimento oferecido com resultados de pesquisas anteriores—preferencialmente, as apresentadas durante a revisão de literatura ou referencial teórico.
- Sua terceira função é reforçar a falseabilidade do artigo: a conclusão é o momento de justificar omissões conscientes e/ou inevitáveis, limitações de método, coleta de dados, etc. Uma conclusão bem redigida deriva de uma consciência sólida e rigorosa do próprio processo de pesquisa científica.
- A quarta função da conclusão é sinalizar limitações da área de estudo, especialmente apontando quais pesquisas serão ou deveriam ser desenvolvidas, para aprimorar o conhecimento sobre o objeto em questão ou objetos relacionados. A conclusão, mais que um fim, é promissora de novos recomeços.
Finalmente—e aqui é necessário um grau muito elevado de autoconsciência e uma grande vontade de aprendizado e crescimento pessoal como pesquisadores e estudantes—, a conclusão não pode ser salva se houver problemas redacionais mais graves nas demais seções, especialmente se forem oriundos de limitações mais sérias na pesquisa e análise de dados. Se nossa discussão teórica não discute, se nossa coleta de dados não colige, se nossa análise não analisa—algo a que pesquisadores menos experientes, e às vezes nem tanto, estão sujeitos—, certamente nos sentiremos perdidos na hora de concluir, simplesmente porque não concluímos coisa alguma.
Por trás de todas essas limitações, esconde-se, talvez, a cultura do publish or perish: pesquisadores iniciantes, não raro ainda durante a graduação, sendo obrigados a escreverem feito especialistas num gênero textual do qual sequer se tornaram leitores proficientes. Quem não tem a prática de ler artigos, quem não compreende como a leitura de artigos nos auxilia a nos inserirmos dentro de comunidades de pesquisa, certamente terá dificuldades em redigi-los. Se o artigo serve apenas para pontuar um currículo, não para contribuir com a produção de conhecimento, não saberemos—talvez, infelizmente, nem precisemos nem desejemos saber—como introduzir, desenvolver ou concluir.