Redigindo (e traduzindo) resultados de pesquisa
Como tradutor de artigos acadêmicos, percebo que uma das seções mais difíceis de se redigir é precisamente a apresentação dos resultados—especialmente quando sua discussão é reservada a uma seção posterior.
Em pesquisas de natureza quantitativa, existe uma grande soma de dados sensíveis: dados que não devem ser traduzidos, mas adaptados, como números (o português emprega vírgulas para casas decimais, e pontos para separar o milhar; o inglês faz exatamente o contrário: 0,7 e 1.350 devem ser mudados para 0.7 e 1,350, e vice-versa), abreviações próprias do artigo, etc. Este material, apresentado em gráficos e tabelas, constitui a parte mais importante dos resultados.
Para o tradutor, se os gráficos apresentam o problema da manutenção destes dados, vitais para o relato exato e preciso dos resultados de pesquisa, também oferecem um parâmetro para esclarecimento do texto, se necessário; para os autores, o problema que apresentam é redacional: o texto da seção de resultados pode soar como mera paráfrase das tabelas. A dificuldade aqui está em gerar um texto relevante, uma vez que tais dados são melhor e mais claramente apresentados de forma esquemática; adicionalmente, devido ao paralelismo dos dados, a redação pode beirar o repetitivo, ou ser sufocada por autoparáfrases canhestras.
Aqui vão algumas dicas para melhor redigir os resultados de pesquisa:
- Seleção dos dados: Os dados da pesquisa estão integralmente reproduzidos em tabelas e gráficos; curiosamente, o texto de apresentação destes resultados não irá apresentá-los, mas salientar aquilo a que se deseja que o leitor preste atenção. Assim sendo, selecione cautelosamente quais dados devem fazer parte desta redação. Acima de tudo, tenha em mente que seria mais útil apresentar os dados que serão discutidos na seção subseqüente.
- Relação entre dados: Outra estratégia importante—que, em certa medida, já adianta a discussão dos resultados—, é comparar e relacionar os dados; destaque onde houve mais crescimento, lento ou abrupto, onde houve quedas, compare os dados de um período a outro, faça algum tipo de ranqueamento entre dados comparáveis. Desta maneira, o texto não será apenas uma reprodução do que está nas tabelas, mas permitirá que os números apresentados interajam entre si.
- Paralelismos estruturais: Embora a elegância algumas vezes seja destacada como valor científico, esta é uma característica estilística menos importante que a clareza e a consistência terminológica. Dizer as mesmas coisas do mesmo jeito pode soar um tanto monótono, mas auxilia o leitor a relacionar dados idênticos ou suficientemente semelhantes. Às vezes, os redatores de artigos científicos se perdem buscando paráfrases, para evitar repetir estruturalmente sentenças que apresentam dados pertencentes a um mesmo conjunto. Repetir-se estruturalmente pode não ser tão ruim assim, pois ajudará o leitor a se focar no que é verdadeiramente relevante. Mantenha a escrita simples e direta; uma sintaxe complexa e rebuscada, um vocabulário esdrúxulo não tornarão seu texto mais complexo, apenas mais difícil de se ler.
- Apresentação e discussão: As duas sessões podem às vezes parecer idênticas, e os redatores podem ter certa confusão sobre o que deve ser inserido em cada uma. Na apresentação, os dados são dispostos à frente do leitor; na discussão, os pesquisadores se posicionam acerca daquilo que os dados não dizem por si sós, ou seja, é quando oferecem sua interpretação sobre a relação entre os dados, as hipóteses e os objetivos de pesquisa. A apresentação, como ficou dito acima, seleciona e relaciona os dados relevantes, ou seja, os que se deseja discutir; a discussão deve oferecer a opinião embasada dos pesquisadores acerca destes dados: O que é possível inferir a partir deles? O que nos dizem sobre o problema em questão? Os dados que temos são suficientes para dar conta de nossos objetivos de pesquisa? Ter em mente essa diferença nos auxilia, por um lado, a não repetir dados desnecessariamente durante a discussão, e a não emitir opinião prematura durante a apresentação. Uma estratégia redacional eficiente é esboçar a discussão antes de redigir a apresentação; assim, o redator sabe quais dados foram de fato mencionados na discussão, para destacá-los no texto da apresentação.
- Tradução dos dados sensíveis: Conforme apontei em outra ocasião, se os gráficos e tabelas se apresentam em arquivos de imagem, o tradutor deverá gerar uma legenda. Isso impacta não somente o orçamento (uma vez que texto de gráficos e tabelas em imagem não tem como entrar no cômputo geral do orçamento), mas também torna o trabalho de manutenção destes dados mais minucioso e demorado. Pode ser producente oferecer uma versão em formato de processador de texto (.doc, .docx, .rtf, etc.) dos gráficos e tabelas, para que o tradutor possa atuar sobre esta versão—isto é particularmente recomendado caso haja pressa na entrega da tradução.
- Tradução dos resultados de pesquisa: Converse com seu tradutor sobre estratégias para aprimorar a redação do texto-meta; como apontei em texto anterior, o tradutor é um leitor especializado, que pode auxiliar a desenvolver a redação do texto. Se o artigo está sendo publicado diretamente em tradução, não há nenhuma razão para que siga exatamente a forma do texto-fonte; é possível negociar uma redação mais limpa e organizada, caso haja necessidade.